domingo, 16 de junho de 2013

SOBRE A CHUVA DOS CAMPOS

Dalcídio Jurandir



Eu sou um dos personagens de teu Ciclo Extremo, recolhido na rede, vagando sobre os campos. Eu lembro uma riqueza antiga de uma casa decadente, as minhas vigas podres foram esquecidas.
Eu sou a cicatriz no rosto de Orminda. O sangue de Alaíde vertido do ventre maculando-lhe o destino. Eu sou uma oração de São Cipriano perdida na boca de Ciloca, marcado pela peste, eu sou Eutanásio buscando a morte e a paixão. Antes de fechar o livro as minhas mãos negras acariciam as letras de cada página. Há muitos caminhos, não há um lugar.
O meu vulto encontrou nas fogueiras acesas um descanso fugaz, nas histórias ouve vozes acuadas e o silêncio se propagando em madeira oca. Todo o peso que carrego flutua sobre os alagados. Tuas palavras me acordam o vazio e o tédio como um sinal. As minhas mãos manchadas de sangue se misturam às tuas descrições sinuosas e avassaladoras. Não são as tuas palavras, são meus olhos que enxergam por dentro. Como um delírio que cobre inteiramente a dor de um dia comum numa cidade alucinada, as palavras que encontro em teus livros me movem sobre a ausência.  



Fotos de Maria Christina para a serie Sanctus




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