domingo, 5 de janeiro de 2014

CIDADES SUBMERSAS

Foto de Paula Sampaio

Tua alma de ar ameno e taciturno, teu bosque comovido pela luz, limiar entre meu corpo e o teu, padecente. Estás parado e não sabes para onde voltar teu espírito. Sobre a superfície lisa do vento escorre teu olhar, gota a gota. À frente muros ardem de sol, a casa no início da rua incrustada de fogo; estás inerte, tua boca emudecida para o que seja, jornal respingando sangue na direção dos teus olhos, que baços, não o vêem.  Quem te dirá do mundo para que possas ouvir?
Não sei quanto tempo resta, da janela vejo sombras que se dissolvem na noite em início, minha mala está pronta, próxima à porta. Nesta carta há preditas distâncias. Eu me ausentarei em breve, assim que seja findo o que tenho que dizer-te. Não há início que se cumpra, tudo é uma partida, um prolongamento de vazios. Sair é pertença finda. O que mais seria a vida senão a queda brusca de um copo cheio de água? Sim, sentirás minha ausência de poço fundo habitado pelo nada, conduzirás flores à minha lápide, chorarás por uma semana ou quinze dias. Mas retornarás ao teu jornal aberto, teus muros de ferro, tua casa vazia ao longe. Não tão longe talvez.

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